Na semana em que a OMS (Organização Mundial de Saúde) classificou linguiça, bacon, presunto e outras carnes processadas como substâncias causadoras de câncer, a BBC Brasil pediu à IARC (Agência Internacional de Pesquisa de Câncer), um dos braços da organização, para elaborar uma lista das substâncias cancerígenas, ou situações de risco, mais comumente presentes no dia a dia das pessoas.
"Não é que essas substâncias sejam altamente tóxicas por si só, mas elas são amplamente usadas nas nossas vidas e é por isso que precisamos estar atentos aos danos que causam", disse o porta-voz Nicolas Godin.
A boa notícia, segundo Godin, é que muitos fatores de vulnerabilidade podem ser evitados.
"Desenvolver a doença é, até certo ponto, também uma questão de estilo de vida", ressalta.
"Na prática, há dois grandes grupos de agentes cancerígenos, os que não podemos evitar e os que podemos. Basta fazer escolhas."
A OMS categoriza em quatro classes o perigo que substâncias ou situações representam à saúde.
São considerados "comprovadamente cancerígenos aos humanos" os 118 agentes contidos na categoria "1". Os 363 itens da categoria "2A" e "2B" são avaliados como "provável" e "possivelmente" cancerígenos. Itens do grupo "3" são "não classificáveis quanto a sua carcinogenicidade a humanos" e a categoria "4" só possui uma substância considerada "provavelmente não cancerígena aos humanos", o composto orgânico caprolactam.
Veja abaixo a lista das substâncias do grupo 1 mais comuns no nosso dia a dia, preparada pela IARC.
Veja abaixo a lista das substâncias do grupo 1 mais comuns no nosso dia a dia, preparada pela IARC.
1) Tabaco
De acordo com estimativas da OMS, o tabaco mata até metade dos usuários da substância que pode ser fumada ou mascada. A cada ano, mais de 5 milhões de pessoas morrem em decorrência do fumo.
"O cigarro é de longe o maior cancerígeno do mundo moderno. Imagine uma pessoa que fumou quatro cigarros ao dia ao longo de 40 anos? Não há como calcular. A toxidade disso é enorme", disse à BBC Brasil Christoph Rochlitz, chefe do departamento de oncologia do Hospital da Universidade da Basileia, na Suíça.
2) Fumo passivo
Estar ao lado de uma pessoa fumando pode ser tão mortal quanto fumar, segundo a OMS.
Dados estimam que o fumo passivo mata mais de 600 mil pessoas ao ano. Desse total, 28% são crianças. Em adultos, a exposição à fumaça do tabaco gera sérias doenças cardiorrespiratórias, além, de câncer de pulmão.
O fumo passivo é apontado como causa de morte súbita em bebês. Em mulheres grávidas, ele pode ter o efeito de causar nascimento de bebês com baixo peso.
3) Poluição
A poluição do ar é um problema de saúde pública que independe do estilo de vida dos indivíduos.
A qualidade do ar nas 1,6 mil cidades monitoradas pela OMS avança rumo à deterioração. Entre os 91 países estudados, os níveis de poluição apresentaram significante piora na última avaliação, divulgada em maio de 2014.
A organização estima que, em 2012, cerca de 3,7 milhões de pessoas com menos de 60 anos morreram em decorrência da exposição à poluição.
"É um fator externo que não se pode controlar e isso depende das políticas públicas ambientais de cada país infelizmente", avalia Rochlitz.
4) Exposição a raios ultravioleta
Melanoma maligno é o tipo de câncer de pele mais letal resultante da exposição excessiva aos raios ultravioleta emitidos pelo Sol.
É a principal causa de morte por câncer de pele. Evitar queimaduras solares, principalmente a superexposição repetida durante a infância, é recomendado.
Indivíduos de pele branca são mais suscetíveis à doença.
"Mas aí também vai da pessoa querer se proteger. A Austrália, que era campeã em incidência da doença, hoje já apresenta em alguns estudos índices menores de câncer de pele do que os países nórdicos da Europa. Isso se deve à tomada de consciência da população que passou a utilizar protetor solar e mudou seus hábitos", explica Rochlitz.
5) Fumaça de motores a diesel
A fumaça emitida por motores alimentados a diesel é considerada um agente cancerígeno categoria "1" desde a década de 80, por conter nitroarenos, compostos resultantes da combustão incompleta do combustível.
"Em termos de toxidade, estamos falando de um elemento muito danoso, mas não há como especificar o impacto específico dessa substância, porque as pessoas estão expostas a ela em ambiente abertos", diz Rochlitz.
Um estudo de 2012 em parceria do Instituto Nacional de Câncer e do Instituto Nacional de Saúde e Segurança do Trabalho dos Estados Unidos constatou aumento no risco de mortes por câncer de pulmão entre mineiros que trabalhavam no subsolo expostos à fumaça de diesel.
6) Contato com químicos formaldeídos
O formaldeído é um químico bastante comum, amplamente utilizado na fabricação de resinas e presente em produtos como solvente de cola.
Trata-se de um gás oriundo da oxidação do metanol, mas também pode ser encontrado na forma líquida, o formol.
O principal risco vem da inalação, que pode resultar em câncer da região do nariz e da faringe, e em leucemia.
"Mas se você não está diretamente exposto ao produto por meio do seu ambiente de trabalho, não deveria se preocupar muito com isso. É uma causa de câncer, mas pode ser
evitada", avalia Godin.
evitada", avalia Godin.
"É um risco ocupacional para pintores. Tintas são complexas e variam muito. Algumas são cancerígenas, mas não é possível apontar um único agente específico", pondera o pesquisador da IACR, Robert Baan.
7) Uso de hormônios progesterona e estrogênio em reposição hormonal, ou em pílulas
anticoncepcionais
anticoncepcionais
Tema de muita polêmica entre as mulheres, tratamentos de reposição hormonal e métodos anticoncepcionais são apontados como comprovados fatores do aumento de risco de câncer quando há uso de hormônios combinados.
Estudos da OMS de 2007 concluíram que o uso associado de progesterona e estrogênio em mulheres após a menopausa aumentavam as chances de desenvolver câncer de mama.
Pílulas contraceptivas contendo os dois ingredientes também são consideradas carcinogênicas da categoria "1". "Sim, é comprovado que a combinação desses hormônios é cancerígena", assinala Rochlitz.
A IARC faz a ressalva, porém, de que esses agentes servem para proteger contra câncer de ovário e da mucosa uterina.
8) Álcool
"O álcool é uma substância que pode ser boa ou má, dependendo da quantidade e qualidade que você ingere", avalia Rochlitz.
Consta na lista IARC que álcool etanol e álcool metil presentes em bebidas alcoólicas são substâncias comprovadamente cancerígenas do tipo "1".
Rochlitz ressalta, porém, que o consumo moderado de vinho pode ajudar o sistema cardiovascular, segundo pesquisas recentes. Existem 2 bilhões de consumidores de álcool no mundo e, desse total, 76,3 milhões sofrem de alcoolismo, segundo números da OMS.
9) Carne processada
Adicionado recentemente à lista das substâncias cancerígenas, a carne vermelha processada é amplamente consumida no mundo industrializado.
Bacon, linguiça e presunto fazem parte do café da manhã da maioria das famílias e abandonar esses ingredientes é a nova recomendação da OMS.
"Um aumento no consumo de 50 gramas ao dia de carne processada representa 18% a mais de chances de desenvolver câncer da região do colo e reto. Eu mesmo vou passar a moderar a dieta", exemplifica Rochlitz.
10) Exposição ao gás radônio
Pouco conhecido fora da tabela periódica, o radônio é um gás radioativo - resíduo da desintegração de urânio e tório presente em rochas - que sobe do solo à superfície. O gás em geral se dilui no ambiente, mas pode ter concentrações perigosas em ambientes fechados. Alguns materiais de construção também são fonte de radônio.
Ele é incolor, inodoro e é a principal causa específica de mortes por câncer de pulmão após o tabaco.
A epidemiologista Lene Veiga, do Conselho Nacional de Energia Nuclear, é a representante brasileira nos encontros da OMS sobre o assunto.
Ela explica que no Brasil ainda não há um levantamento específico sobre a extensão do problema, mas países desenvolvidos de clima temperado ─ onde as casas têm calefação e
isolamento térmico ─ já buscam desenvolver políticas públicas.
isolamento térmico ─ já buscam desenvolver políticas públicas.
"O gás está presente no material de construção. É um fator que não podemos controlar, mas precisamos entender. As pessoas estão expostas a isso inevitavelmente", conclui
Veiga.
Veiga.