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sábado, 27 de fevereiro de 2016

Terreiro na Baixada Fluminense completa 130 anos e pode virar patrimônio cultural

A casa simples no número 1.029 da Rua Florisbela, em Coelho da Rocha, São João de Meriti, esconde mais de um século de vida e uma história pioneira entre os centros de candomblé do Rio. O terreiro Ilé Àsé Òpó Afònjá (que significa casa de força sustentada por Afònjá, uma qualidade de Xangô) é considerado o primeiro da nação Ketu — uma etnia africana — no estado.


Livro conta história do Ilé Àsé Òpó Afònjá
Livro conta história do Ilé Àsé Òpó Afònjá 
Foto: Cléber Júnior / Extra

As atividades começaram em 1886 na Pedra do Sal, Zona Portuária, onde os escravos vindos da África desembarcavam no passado. Após várias mudanças para fugir da intolerância religiosa (veja na página 9 por onde a casa passou), o centro se estabeleceu em Meriti em 1944, e lá está até hoje.
Quem coordena tudo por lá atualmente é a Mãe Regina Lúcia D’Yemonjá, da quarta geração descendente de Mãe Aninha de Xangô, responsável por abrir o terreiro há 130 anos (também na página 9, confira as mães de santo que passaram pelo local).


Mãe Regina pertence a quarta geração descendente de Mãe Aninha de Xangô
Mãe Regina pertence a quarta geração descendente de Mãe Aninha de Xangô Foto: Cléber Júnior / Agência O Globo

— Ela (Aninha) veio de Salvador (Bahia) para fundar a casa no Rio. Mas, naquela época, nosso axé (fé) era muito perseguido pela polícia. Então, tivemos que mudar muito de endereço até encontrar esse lugar na Baixada — explica a Mãe Regina, de 75 anos.
A ialorixá garante que hoje não sofre com essa perseguição e afirma que é respeitada pelos vizinhos:
— Ao lado do terreiro tem uma igreja evangélica, mas ninguém mexe com a gente. Até porque quando todos chegaram aqui, nós já estávamos. É uma questão de respeito.


Centro de candomblé tem apenas mulheres para cuidar dos afazeres
Centro de candomblé tem apenas mulheres para cuidar dos afazeres 
Foto: Cléber Júnior / Extra

Com tanta importância, o terreiro espera ser tombado como patrimônio histórico do estado até o fim do ano. E um dos maiores defensores da ideia vem do catolicismo: o Frei Athaylton Jorge Monteiro Belo, o Tatá, da Igreja de São João Batista, também em Meriti, que está ajudando na documentação para abrir o processo de tombamento.
— O Ilé Àsé é um dos locais mais importantes para a história negra do Rio. Esse tombamento vai fazer com que se crie aqui um turismo étnico e religioso, além de ajudar a desconstruir qualquer tipo de intolerância e a preservar tradições — diz o Frei, que é coordenador de políticas de igualdade racial da Secretaria municipal de Direitos Humanos e Igualdade Racial de Meriti.


Terreiro é dedicado ao orixá Xangô
Terreiro é dedicado ao orixá Xangô 
Foto: Cléber Júnior / Extra

Enquanto não batem o martelo, a casa tem sua história contada num livro. “Da Pedra do Sal até Coelho da Rocha — Ilé Àsé Òpó Afònjá” foi escrito há algumas décadas por Ed Machado para celebrar os 100 anos do terreiro e acaba de ganhar uma atualização.
— Nossa principal missão é manter a chama do candomblé acesa. Xangô me deu essa responsabilidade, e junto com minha família vou lutando para mantê-la — afirma Mãe Regina.